Simulação de Assembleia: Fixar na Constituição um limite para o défice no Orçamento do Estado
Nuno Matias
Vamos então passar para o debate seguinte.
Pedimos ao Grupo Bege que tome o lugar da bancada do
Governo. Ao Grupo Verde para se colocar à nossa esquerda, no lugar da Oposição
1. E ao Grupo Cinzento, à nossa direita para a Oposição 2.
Peço aos outros grupos para se sentarem com alguma
ligeireza. Estamos um pouco atrasados.
Vamos então começar o quarto debate da sessão. O tema da
proposta do Governo é "Fixar na Constituição um limite para o défice do
orçamento de Estado”.
Em nome do Governo Bege, tem cinco minutos, o Ministro
Mário Pedro Cristelo.
Mário Pedro Cristelo
Senhora Presidente da Assembleia da República, senhora e
senhores membros do Governo, senhoras e senhores Deputados;
Iniciamos hoje o debate político sobre um tema
absolutamente decisivo para o futuro da nossa vida coletiva. A existência de
défices orçamentais sucessivos e elevados tem-se assumido como um problema
estrutural da economia portuguesa. Desde a implantação da Terceira República, ou
seja, nos últimos quarenta e dois anos, o país registou sempre défices
orçamentais. Por outras palavras, o Estado, para satisfazer as necessidades dos
cidadãos gastou sempre mais do que aquilo que recebia, sendo que, no mesmo
horizonte temporal, apenas por seis ocasiões a República conseguiu obter um
défice inferior a 3% do produto interno bruto, mas nunca, enalteço, nunca um
excedente orçamental.
Assim, para fazer face a todas as despesas, o Estado
necessita de se financiar junto dos mercados internacionais. Com a existência
de sucessivos e elevados défices, o país precisa de aumentar impostos sobre os
cidadãos, por forma a garantir junto daqueles que nos emprestam o dinheiro que
vamos conseguir pagar, honrando os nossos compromissos.
Com o aumento dos impostos, as famílias veem o seu
rendimento disponível diminuir, perdendo o bem-estar, diminuindo o seu consumo
e, por isso, a procura.
Por outro lado, as empresas têm de pagar mais impostos,
perdendo competitividade num mundo global, e deparando-se ainda com uma
diminuição da procura dos particulares.
Senhora Presidente, senhoras e senhores Deputados, a
consequência é inevitável – desemprego. Com o aumento do desemprego, as pessoas
ficam pior, o Estado gasta mais em prestações sociais e recebe menos receita
por existirem menos empregados e menos empresas.
Neste cenário, o défice aumenta e o país vê-se na
situação de pedir mais dinheiro emprestado, agora a taxas de juro superiores,
refletindo a desconfiança daqueles que nos concederam financiamento. Deste
modo, o Estado necessita de recolher mais impostos, sobrecarregando famílias e
empresas.
Por outro lado, com o aumento dos impostos, o desemprego
aumenta e o consumo diminui. Nesta conjuntura de baixo crescimento, Portugal
torna-se pouco atrativo para o investimento estrangeiro de que tanto necessita.
Por outro lado, as empresas financiam-se a uma taxa semelhante à do Estado, a
longo prazo, pelo que, pelo aumento da taxa de juro (que é o seu custo de
financiamento) adiam bastantes financiamentos. Como consequência, o
investimento diminui, não sendo desta feita criados postos de trabalho,
prejudicando a vida da população.
Com o aumento de gastos com juros, o país não consegue
alocar tantos recursos para áreas como a educação e a saúde, comprometendo a
igualdade de oportunidades e a mobilidade social dos nossos filhos, pilar
absolutamente angular da nossa sociedade democrática. Perpetuando
desigualdades, o efeito de reprodução social… penalizando aqueles que menos
têm, condicionado o futuro das próximas gerações e o futuro de Portugal.
Senhora Presidente, senhoras e senhores Deputados, não há
nada mais injusto do que isto, e o executivo não aceita esta situação. Não
aceitamos que uma pessoa que nasça pobre, pobre fica porque o país lhe nega as
oportunidades. O mérito, sempre o mérito como diferenciador social.
Como resposta aos problemas acimas expostos, o governo a
que tenho a honra de presidir, propõe a introdução no texto constitucional de
um limite ao défice orçamental de valor não superior a 3% do produto interno
bruto. Este valor vai de encontro ao limite do défice, também ele de 3%,
plasmado no Pacto de Estabilidade e Crescimento assinado por Portugal no quadro
da União Económica e Monetária, reforçando a presença de Portugal no projeto
europeu, do qual é beneficiário líquido, e a credibilidade do país junto de
todos os agentes.
Com a fixação do limite ao défice na Constituição, o país
passaria obrigatoriamente a entrar numa trajetória de contas públicas
equilibradas, diminuindo a dependência face ao financiamento externo. Com a
diminuição do défice, as taxas de juro exercida por quem nos empresta dinheiro
seriam menores, permitindo a médio prazo uma descida do peso dos juros no
orçamento, libertando recursos para a produção de bens de mérito, que são
fundamentais para o crescimento do país.
Simultaneamente, com a diminuição das taxas de juro pagas
pela República as empresas passariam a financiar-se a um custo mais baixo,
viabilizando a concretização de projetos de investimento, com nítidas
consequências positivas para o emprego.
Por outro lado, o Estado, agora com menor necessidade de
financiamento, poderia reduzir o ónus fiscal sobre os seus cidadãos, fomentando
o crescimento económico, passando o país a ser mais atrativo para investidores
internacionais, traduzindo-se numa melhoria da qualidade de vida dos
portugueses.
A introdução de um limite ao défice na Constituição admite,
de forma conjuntural e em situações específicas, défices superiores ao limite
imposto, desde que para tal haja compensação.
Senhora Presidente da Assembleia da República, senhoras e
senhores Deputados, a proposta que hoje damos a conhecer ao país e ao
Parlamento não é uma proposta fechada, estamos abertos a sugestões e desejamos
o contributo de todas as forças partidárias.
Sobre uma matéria de interesse relevante para o país,
apelo a um debate sério e construtivo, desprovido de retórica partidária, como
fiz e procurei fazer. Portugal, país que todos amamos, é um lugar repleto de
virtudes e oportunidades. E assim torno público o meu profundo sentimento: não
desisto de Portugal. [ Nuno Matias :
Senhor Ministro, dispõe de 30 segundos.]
Tenhamos todos a coragem de Álvaro Cunhal, a lucidez de
Francisco Louçã, a vontade de Mário Soares, a seriedade de Adriano Moreira.
Saibamos estar à altura das nossas responsabilidades. Pelo país, não pelo
executivo, será sempre e sempre uma vitória coletiva. Como diria Francisco Sá
Carneiro, primeiro o país, depois o partido e então por último os interesse
individuais de cada um de nós.
Muito obrigado.
[Aplausos]
Nuno Matias
Muito obrigado. Tem agora a palavra, para um pedido de
esclarecimento, por três minutos, o senhor Deputado Daniel Pereira, do Grupo
Parlamentar Verde.
Daniel Pereira
Obrigado, senhor Presidente. Caro Governo, caríssimos Deputados
e Deputadas;
Senhor Ministro, já que tem um governo com uma visão tão
grande, diga-me o que vê aqui. Eu vejo meia folha cheia de disparates. O que
fará se fosse a folha inteira. Procurei realmente no dicionário palavras que
definem tanta incompetência e confesso que não encontrei.
No curto programa afirmam o cumprimento com a União
Europeia de um limite máximo de 3% do défice. Muito bem. Mas o que se passa é
que em vinte anos só em dois é que atingiu o défice, os 3%. Não superou.
O seu governo hoje devia era apresentar um programa não
de limitação de défice, mas sim de como o vamos cumprir.
Fomentar o crescimento económico, que é o que vocês
apresentam aqui? Senhor Ministro, mas desde quando é que limitação de défice é
sinónimo de crescimento económico?
Redução da dívida pública? Enquanto há défice, não há
redução da dívida pública, senhor Ministro, na melhor das hipóteses há
abrandamento. E isto é ridículo para um ministro.
Eu vou contar uma história. Isto é o mesmo que o senhor
Ministro estar, a cada ano que passa, a acomodar uma dívida de cem euros
durante os últimos vinte. Ou o senhor ministro dos incumprimentos, aí ao seu
lado sentado. Isto faz um total de dois mil euros. E dizer de seguida que se
vai autocontrolar e que agora não vai ficar a dever cem por ano, mas sim
cinquenta. Mas vai continuar a dever cada vez mais. Só abrandou, não começou a
cobrar a dívida. Se não perceber posso depois fazer um desenho ao senhor
Ministro e ao senhor ministro da incompetência.
[Aplausos]
Respeito pelos compromissos europeus. Então apresente
propostas para reduzir o défice.
Garantir o futuro das próximas gerações, senhor Ministro.
Como vai garantir o futuro das próximas gerações, se até hoje nunca respeitaram
os compromissos acordados? Parabéns ao senhor ministro dos incumprimentos.
[Aplausos]
Finalmente, diz que o seu limite de défice é 3%. Porquê
três? Porque não vai ser mais ambicioso e ir aos 2,8 ou 2,5, para dar uma
margem à União Europeia? Vamos estar a trabalhar para a nota mínima.
E vou ainda mais longe. E se o país entrasse em estado de
emergência? Vamos manter os 3% como limite enquanto vemos o país morrer?
Para o seu governo, esta é a estratégia saudável. Ter
défice é saudável. Já me fazem lembrar o nosso ex-primeiro-ministro José
Sócrates [ Nuno Matias : Dispõe de 30
segundos.] …quando diz que a dívida não se paga, gere-se.
Sei que é duro para o senhor Primeiro-ministro, mas, além
de ter um ministro do incumprimento, tem também um governo incompetente.
E terminando, dizendo: isto não é um programa de governo,
isto é um programa de vergonha.
[Aplausos]
Nuno Matias
Muito obrigado. Tem agora a palavra, para um pedido de
esclarecimento, por parte do Grupo Parlamentar Cinzento, o deputado Gonçalo
Armindo. Dispõe de três minutos.
Gonçalo Armindo
Começo por cumprimentar a senhora Presidente de Mesa, o
senhor Presidente de Mesa, peço desculpa, o senhor Primeiro-ministro e o
restante Governo, senhoras Deputadas e senhores Deputados;
Felicito, desde já, a forma clara e simples como o
Governo apresentou a esta Assembleia o vosso programa de governo. Este programa
é descabido de qualquer realidade política e conhecimento económico. Em vez de
andarem preocupados a dar estabilidade ao país, andam preocupados a brincar aos
advogados.
A arte de governar tem que ser acompanhada por três
princípios: ética, honestidade e respeito por aqueles que votaram em nós. O
objetivo para o défice não pode ser nem 1, nem 3, nem 5, nem 7%. O objetivo
para o défice tem de ser não haver défice, senhor Primeiro-ministro.
Antes que esta Assembleia incorra no erro de permitir que
a revisão constitucional vá para a frente, tenho que falar de alguns pontos que
destacam melhor a imaturidade política deste governo. Toda a economia possui
uma taxa de flexibilidade muito imprevisível.
Analisando o histórico da economia nos últimos três anos,
percebemos que o investimento diminuiu e a despesa do Estado aumentou. Como é
que o objetivo de fomentar o crescimento económico é só primordial quando se
limitar o défice?
O senhor Primeiro-ministro tem noção que, caso a sua
proposta seja aceite, e o défice atual esteja na ronda dos 4,4% do PIB, o seu
orçamento fica inconstitucional e o país pára? O senhor Primeiro-ministro tem
noção que, caso isso aconteça, os hospitais param e o senhor Primeiro-ministro
não consegue nem pagar ordenados, nem reformas, nem pensões? O senhor Primeiro-ministro
tem noção que, se esta situação inconstitucional acontecer, nenhum governo
conseguirá endireitar este país.
Por último, deixe-me admirar o seu respeito pelos
compromissos europeus. As metas europeias podem ser atingidas sem a regra de
ouro. Até porque, se as metas europeias se alterarem, irá o seu governo ter que
ser obrigado a rever novamente a Constituição, e andarmos um bocadinho ao sabor
da União Europeia?
Termino a minha intervenção dizendo: a limitação do
défice não pode ser… [ Nuno Matias :
Dispõe de 30 segundos.] obrigado, a limitação do défice não pode ser uma
imposição legal. A limitação do défice tem de ser uma imposição ética.
Obrigado.
[Aplausos]
Nuno Matias
Muito obrigado. Para dar esclarecimentos, pelo Governo
Bege, o Ministro Ricardo Grilo. Dispõe de três minutos.
Ricardo Grilo
Senhor Presidente da Assembleia da República, senhores
membros do Governo, senhoras e senhores Deputados;
Antes de mais quero dizer que fico contente por terem
tido oportunidade de ver o nosso programa de governo. Tenho pena que não tenham
tido tempo de o ler. Isto porque, se tivessem lido o programa de governo iriam
compreender que aquilo que nós definimos é um teto máximo de 3% e não é a nossa
meta atingir 3%. Ou seja, como é óbvio, nós queremos sempre menos do que 3%, no
entanto, peço desculpa, senhor Deputado, mas vai ter que me dar tempo para lhe responder.
Obrigado.
Para além disso, aquilo que acontece é que estes 3% é o
valor definido pela União Europeia, e, como deverá saber, nós não podemos ser
mais papistas do que o próprio papa. Ou seja, nós não podemos exigir mais aos
portugueses, que estão fartos de ter conceitos como austeridade e um futuro
hipotecado, e o nosso objetivo é resolver aquilo que muitos governos anteriores
ao nosso foram incapazes de conseguir, e que foi um crescimento sustentado,
equilibrado e amigo dos portugueses que, tal como o Ministro Mário Pedro disse,
fosse capaz de dar um futuro aos portugueses. E é isso que nós nos propomos.
Como? De uma forma muito simples. Colocar na Constituição
significaria então que todos os governos vão assumir o compromisso de conseguir
finanças públicas saudáveis, equilibradas, voltadas para o crescimento, para o
emprego e para o investimento. A verdade é que nós aqui referimos vários nomes,
que são de diferentes ideologias, e que revela a nossa capacidade de sermos
transversais em ideologias, porque aquilo que nos preocupa realmente é o futuro
dos portugueses. E é essa a verdadeira credibilidade.
Para além disso, (obrigado por me estar a apontar a
Constituição, conheço perfeitamente) e deixe-me dizer-lhe que as sanções de que
falam, e que o facto de nós não cumprirmos os 3% podem levar a que o Governo
seja não constitucional, isso significa que – não disse o senhor, mas disse o
outro na primeira intervenção – e o foco é, se olhamos para todos os países que
já têm um défice instituído nas suas Constituições, existe sempre a
possibilidade de não cumprir o défice, porque existem catástrofes naturais,
existem períodos de recessão económica e existem também situações de emergência
nacional que levam, obviamente, o défice a não ser cumprido.
Quando isto acontece, está previsto, e posso dar-lhe o
exemplo da Alemanha e da Suíça, que penso que serão referências para nós [ Nuno Matias : Dispõe de 30 segundos.]
das finanças púbicas, que, nos anos seguintes ao não cumprimento desse défice,
terá de ser adotado um programa que lute por conseguir baixar esse défice e por
voltar a tornar-se credível junto das instituições europeias e no panorama
internacional.
Porque aquilo que nos preocupa, enquanto governo, é
garantir, então, que enquanto estivermos em desequilíbrio das finanças
públicas, teremos sempre uma democracia em défice para com os portugueses, e é
isso que nós não queremos.
Obrigado.
[Aplausos]
Nuno Matias
Muito obrigado. Terminado que está o debate, pedia aos
grupos neutros que pudessem votar, e quem entende que ganhou o Governo Bege
levante o braço.
Podem baixar, obrigado.
Quem entende que foi a Oposição 1, Grupo Verde, levante o
braço.
Quem entende que foi a Oposição 2 a ganhar o debate…
É evidente que ganhou o Governo.
Vamos agora querer saber a vossa posição em relação a
esta proposta de fixar na Constituição um limite para o défice do Orçamento de
Estado.
Quem é a favor desta fixação de limite?
Quem é contra a fixação do limite do défice?
Há uma maioria favorável à fixação na Constituição de um
limite do défice.
Passamos a palavra aos nossos comentadores.
Duarte Marques
Eu acho que isto foi um debate que teve a sua graça. Eu
acho que o Governo mereceu ganhar, de facto. Devo dizer que o Mário Pedro tem
um texto espetacular. O teu texto é muito bom, acho que leste muito bem o
texto, mas eu acho que tu ganhavas vantagem se não tivesses a ler o texto em
cima da mesa. Porque tu fazias um esfoço para olhar para a frente de vez em
quando, mas passaste muito tempo em que parecia que tinhas o pescoço partido.
Estavas a ler direitinho, assim…
O texto é muito bom, e eu notava que tu fazias um esforço
para olhar para as pessoas, mas fazia-lo poucas vezes. Não há problema nenhum
em ter um papel na mão para ler. Porque o texto é bom, ele sabe ler. Eu
estou-te a dizer isto, mas correu lindamente. Mas acho que podia correr ainda
um bocadinho melhor. Tiveste a esperteza, a inteligência de ter as letras muito
grandes; além de veres bem, tinhas o texto muito grande, ao contrário do que
fez o governo anterior, que a Joana chamou a atenção, aquele que tinha no
computador, tinha a letra muito pequenina. Portanto, atenção, letra grande,
sempre acima de 14, para poderem ler à distância, tenham uns bons olhos ou
óculos, letra grande que é sempre mais fácil. Ele estava a ler quase a um metro
da mesa, porque ele é muito alto. Mas não tenhas problema de agarrar no papel,
estás a ler, lê à frente. Não é assim… mas podes levantar o papel, não tem
problema nenhum, até porque estavas cheio de coisas boas para dizer.
Há um momento em que tu dizes: eu enalteço não haver
excedente. Tu querias dizer é: eu chamo a atenção, eu saliento. Enaltecer,
estás a elogiar; eu acho que tu não estavas a querer elogiar o não haver excedente.
Tu querias era chamar a atenção, não estavas a elogiar.
Não sei se foste tu, se foi outra pessoa que disse… as
pessoas às vezes confundem o "vou ao encontro de” ou "vou de encontro”. Ir de
encontro é ir contra, é chocar, é discordar. "Ao encontro” é de coisas
parecidas. Tenham cuidado ao usar esta expressão, porque muitas vezes cometemos
esse erro.
Acho que a chave do Mário foi conseguir sempre ter um
discurso tecnicamente muito bom, e ao mesmo tempo ir traduzindo para miúdos. E
isso foi a chave do vosso sucesso, eu acho.
O Ricardo, na resposta, foi muito limpinho, falou sem
papel, completou muito bem o que tinha sido dito antes, a argumentação era
forte, e correu bastante bem. Estava ali sempre com as mãos assim, a andar à
volta com as mãos, mas era uma proteção tua, pareceu-me bem feito. Acho que
vocês ganharam porque os dois se complementaram bastante bem.
O Daniel teve graça, teve piada. Exageraste um bocado nas
piadas; a tua técnica foi só piadas e faltou-te um bocado mais de conteúdo, na
minha opinião. Não podes dizer fazer um desenho - it’s too much. É um bocadinho
baixar o nível, não podes fazer isso. Aqui tem graça, lá fora não tem. Foi
muito bom o teu argumento "e preocupe-se em tomar medidas para evitar o défice,
do que estar a pôr limites ao défice”. Acho que essa parte dominaste e
estiveste bastante bem, mas ficou muito só por aí. E fizeste um exercício que é
inteligente, que é colar uma imagem ao governo. E ele colou a imagem do
ministro do incumprimento. Ele fez isto várias vezes, chamou-lhe sempre
ministro do incumprimento, ministro do incumprimento. Reforçar às vezes as
ideias é muito bom.
Sobre o Gonçalo. Vou-te dizer uma coisa que tu não vais
levar a mal. Tu tens uma facilidade e uma simpatia de discurso que não é normal
na tua idade. Portanto, tu tens essa mais-valia. Agora, tens que te preocupar
em ter o conteúdo certo. Tu arranjaste aí várias frases de sound bite que tu sabes dizer bem, tiveste três ou quatro
argumentos muito bons lá pelo meio, estava a ver onde é que apontei um deles,
até, que eu achei bem, foi o argumento de bloquear o país, acho que foi o
melhor. Mas tu ficaste demasiado confortável na tua capacidade oratória
natural, e esqueceste o conteúdo. Ou seja, achaste: eu vou lá, mando umas
bocas, a malta vai bater palmas, e eu vou tentar ganhar.
Conselho para a vida: tens um dom natural para falar, uma
simpatia natural para falar, cais no goto de toda a gente, és um puto
impecável. Isso não chega. Tens de trabalhar ainda mais, para teres o resto. Se
tu conseguires o resto com trabalho, o que tu tens naturalmente, pouca gente
tem. Portanto, tens mais obrigação do que os outros para trabalhar. OK? Força. Um
abraço.
Ó Mário, esqueci-me de uma coisa: o teu único erro foi
leres muito rápido. Estiveste a ler rápido. Não foi demais, mas leste um
bocadinho demasiado rápido.
Força, parabéns. Foi um bom exercício.
Dep.Carlos Coelho
O que é que eu achei deste exercício? Achei que havia uma
dessintonia entre a fraca qualidade do vosso texto - a vossa proposta é muito
fraca, o programa de governo é muito fraco, aliás o Daniel fez referência a
isso quando citou a ideia da meia página; vocês não falam nas consequências, no
procedimento, quem vê isto não percebe o que é que se pretende -, com a
qualidade da vossa apresentação e da defesa.
Eu acho que foi justo vocês ganharem, porque na simulação
parlamentar vocês tiveram bons argumentos e fizeram bem. O único defeito do
Mário foi aquilo que o Duarte acabou de dizer, leu depressa demais, ou seja,
representou pouco o texto, não teve tempo de representar, teve que o ler, e,
aqui e ali, o texto era demasiado elegante.
Era um texto bom para ser "lido”, mas não um texto bom
para ser "escutado”. O texto para ser escutado tem que ser menos trabalhado sob
o ponto de vista literário; ele estava bem feito, bem escrito, mas era elegante
demais. E lembram-se do Falar Claro, isto não é um concurso de elegância, é um
concurso de eficácia, e quando o texto é elegante demais não é tão eficaz.
O Gonçalo teve uma prestação parlamentar muito boa. O
único senão é ter mantido sempre o pico a representar a indignação. Ou seja, é
convincente quando nós representamos a indignação num momento, mas se temos
todo o discurso com esse registo, perde força a representação da indignação,
porque passa a ser um estado natural e não um momento específico.
De resto, acho que foi um bom exercício e estão todos de
parabéns.