ACTAS  
 
9/3/2016
Simulação de Assembleia: Estabelecer o voto obrigatório
 
Joana Barata Lopes

Eu pedia aos grupos que assumissem os seus lugares. Para a bancada do Governo vem o Grupo Rosa; para a Oposição 1, do nosso lado esquerdo, o Grupo Amarelo; e para a Oposição 2, do nosso lado direito, o Grupo Encarnado.

Pedia-vos que fossem tão rápidos quanto possível.

Pedia-vos que se sentassem para nós podermos iniciar este ponto.

Vamos passar ao ponto nove da nossa Ordem de Trabalhos, Estabelecer o voto obrigatório. Para apresentar a proposta pelo Governo Rosa, tem a palavra o senhor Ministro Artur Teixeira Gomes. Dispõe de cinco minutos. Faça favor senhor Ministro.

 
Artur Teixeira Gomes

Muito obrigado, senhora Presidente. Caros membros do Governo, senhoras e senhores Deputados;

Antes de iniciar a apresentação desta proposta do programa de governo, eu gostaria que todas as senhoras e os senhores deputados refletissem sobre quatro números. Esses quatro números são os seguintes: 35, 40, 42 e 44.

Para o caso de os senhores e das senhoras deputadas não se recordarem destes números, eu posso ajudar. Estes são os números da taxa de abstenção das últimas quatro eleições legislativas. Senhoras e senhores Deputados, se calcularmos a média de todas estas eleições, poderemos compreender que, nas próximas eleições legislativas, iremos atingir os 47% de abstenção.

Senhoras e senhores Deputados, vamos deixar que a abstenção atinja os 50% ou vamos, finalmente, atuar sobre este assunto? Ouvimos muitas vezes pelo povo português perguntar qual é a legitimidade dos órgãos eleitos por menos de metade dos cidadãos. O que eu pergunto é bastante simples: qual é, realmente, a legitimidade de uma Assembleia representativa eleita por menos de metade dos seus representados?

A implementação do voto obrigatório, para além de diminuir a taxa de abstenção, obriga necessariamente a uma maior responsabilização dos cidadãos na vida política e na direção do governo do seu país. Tal como nas escolas, caras senhoras e senhores Deputados, obrigação traz preparação e a preparação traz consciência. Dessa forma, teremos um voto responsável, consciente e que legitima, verdadeiramente, uma assembleia representativa.

Senhoras e senhores deputados, o sistema de voto obrigatório tornaria ainda a nossa Assembleia bem mais equitativa quanto à representação social, uma vez que a taxa de abstenção é muito maior nas camadas sociais de baixos rendimentos.

Esta equidade irá refletir-se na nossa Assembleia de duas formas: aumentando o número de partidos representados ou reforçando os poderes dos atuais partidos.

Senhoras e senhores Deputados, é ainda nossa obrigação minimizar as taxas de abstenção o máximo possível. Ao que, o não exercício do dever obrigatório de voto será, posteriormente, regulamentado pelo Código Penal, criminalizando este dever obrigatório, que terá como sanções a inibição de concorrer a cargos públicos, o trabalho comunitário ou ainda uma multa pecuniária.

Sabemos também que o voto nulo e o voto em banco serão uma realidade e tenderão até a aumentar. Mas um voto, senhoras e senhores Deputados, será sempre um voto, e mesmo que em branco, apenas servirá para reforçar a legitimidade dos órgãos eleitos.

Muito obrigado.

[Aplausos]

 
Joana Barata Lopes

Muito obrigada, senhor Ministro. Para a primeira interpelação ao Governo, pelo Grupo Parlamentar Amarelo, a Oposição 1, tem a palavra a senhora Deputada Ana Vidal. Dispõe de três minutos, senhora Deputada.

 
Ana Vidal

Obrigada. Exma. senhora Presidente da Mesa, senhor Ministro, senhores Deputados, minhas senhoras e meus senhores;

Começo por dizer que me entristece ver que não têm qualquer respeito por aqueles que lutaram durante anos para o direito a um voto livre. É uma pena que ao olhar pelo mundo verifiquemos que temos cerca de 13% de países onde o voto é obrigatório. Os restantes, aqueles que estão aqui a azul claro, têm voto livre. Ou seja, não será representativo que a democracia com voto livre é efetivamente a melhor escolha?

Passemos então para o que nos traz este debate. É uma discussão entre a liberdade de escolha e o dever cívico. Não estaremos, com esta imposição, a cair no autoritarismo? pergunto-me... O voto é um direito e não um dever, senhor Ministro.

Vejamos então, por exemplo, os Estados Unidos. Falou do caso de nós termos uma grande abstenção, é verdade. Os Estados Unidos também a têm. Parte de metade do eleitorado não vota. No entanto, um país que é uma potência mundial não adotou o voto obrigatório. Se calhar é um caso a pensar.

A imposição não trará mais educação política ou cívica. Isto leva-nos a pensar num pressuposto que já todos sabemos: que quantidade não é qualidade.

Assim sendo, com esta imposição, apenas vai fomentar o voto inconsciente e pouco informado. Partidos extremistas e populistas que normalmente têm pouca votação, vão começar a ganhar lugar. E sabe porquê? Sob forma de protesto daqueles que vocês obrigaram a ir votar.

Senhores Deputados, isto é uma violação do processo democrático. Sanções, obrigações, penalizações a quem não vote é uma violação dos direitos e das liberdades individuais. Não votam porque, se calhar, não têm maturidade política, ou então não conhecem o fundamento de todos os vossos processos eleitorais.

Mas como uma oposição crítica, com críticas vazias, em nada contribui para o crescimento do país, apresentamos então algumas medidas que pode tomar para tornar a abstenção menor [ Joana Barata Lopes : Tem 30 segundos, senhora Deputada.] vou já terminar, espere só um bocadinho, porque tenho uma coisa muito importante para lhe dizer, que é que campanhas eleitorais mais objetivas, aumentar a proximidade nas campanhas, educar, informar e consciencializar, isso sim, vai-vos despertar a consciência cívica.

Muito obrigado.

[Aplausos]

 
Joana Barata Lopes

Muito obrigada, senhora Deputada. Para a segunda interpelação ao Governo, pela Oposição 2, tem a palavra pelo Grupo Parlamentar Encarnado, o senhor Deputado Rodrigo Azevedo Mendes. Dispõe de três minutos.

 
Rodrigo Azevedo Mendes

Boa tarde, senhora Presidente da Assembleia, Ministros e Deputados.

Suas excelências parecem não perceber alguns conceitos fundamentais em política. Não parecem saber a diferença entre um direito e um dever, e não parecem saber o que é liberdade. O voto é, antes de tudo, um direito, e também é um dever cívico, obviamente. Mas isso não faz do ato de votar uma obrigação que, caso não seja cumprida, se torne punível por lei.

A Constituição consagra a liberdade do indivíduo para fazer as suas próprias escolhas, e isso inclui a liberdade de não agir sobre os direitos adquiridos. Ou seja, se eu não quiser votar, se não for essa a minha vontade, posso. A Constituição portuguesa diz, e cito: ninguém pode ser total ou parcialmente privado da sua liberdade. E é isso que suas excelências estão a fazer, estão a privar os cidadãos da liberdade de votar. E ouviram-me corretamente.

Dizem V. Exas. que querem, e cito, promover a cidadania ativa. Mas existe uma diferença entre promoção e coação. Suas excelências querem fortalecer o contrato social e diminuir o fosso entre povo e políticos. E nós concordamos, obviamente, com esses objetivos.

Acontece que o Governo, em vez de propor medidas, um conjunto de medidas que realmente ataquem este problema, foram preguiçosos, e apresentaram-nos esta lei violadora das liberdades mais básicas.

Dizem que assim a legitimidade dos eleitos aumentará. Se calhar não se sentem legítimos o suficiente. E a verdade é que um Governo que ataca a Constituição e o direito ao voto tem a sua legitimidade diminuída.

Dizem também que vão combater a abstenção. Combater? Combater, não. Vão proibir. Isto é assim: talvez devessem adotar a política eleitoral de Salazar, já que até os mortos votavam nele.

Dizem que querem multar ou obrigar esses criminosos ruins que não votam a cumprir trabalho comunitário. Trabalho comunitário? Estão a comparar o ato de não votar à posse e tráfico de droga, ao roubo, a conduzir alcoolizado pondo em perigo a vida de outros? É assim que o Governo vê o ato de não votar? Nós concordamos completamente com o combate à abstenção. Uma abstenção de quase 50% é vergonhosa. [ Joana Barata Lopes : Tem 30 segundos, senhor Deputado.] Obrigado. Mas combater não é proibir e violar as liberdades individuais. Combater a abstenção é instaurar o voto eletrónico, é expandir o voto à distância e o voto antecipado. Não apoiamos, nós, Grupo Encarnado e Oposição, não apoiamos esta proposta nem nunca apoiaremos nada que se assemelhe.

Pede-se ao Governo que desista disto e que se reencontre com a democracia, que de autoritarismo está Portugal farto.

[Aplausos]

 
Joana Barata Lopes

Muito obrigado. Para responder às interpelações pelo Governo Rosa, tem a palavra a senhora Ministra Marta Pires. Dispõe de três minutos, senhora Ministra.

 
Marta Pires

Caríssima Presidente da Assembleia da República, caros Deputados;

Em primeiro lugar, quero agradecer à oposição pelo vosso contributo, porque realmente este Governo acredita que é com o contributo de todos que o país vai mais longe, e é por isso, exatamente por isso, que queremos implementar o voto obrigatório, para que todos possam dar o seu contributo.

Falou-se aqui, num primeiro ponto, que nós não temos respeito por aqueles que lutaram pelo voto livre. Quem não vota é que não tem respeito pela luta de anos e anos para que as pessoas pudessem votar. Porque quem não vai às urnas é que desrespeita os antepassados que lutaram para que nós pudéssemos hoje poder ir votar. Isso sim, o voto não é só um direito, mas é um dever que todos nós deveríamos cumprir. Nós estamos aqui a propor isto e não estamos a obrigar ninguém a votar num determinado partido. O voto continua a ser livre. O vosso argumento de liberdade, que iríamos retirar liberdade às pessoas… não, as pessoas vão às urnas e vão votar naquilo que quiserem votar. Se quiserem votar em branco, votam em branco. Se quiserem votar nulo, votam nulo. Se quiserem votar no partido A, B ou C, votam no partido A, B ou C.

Para além do mais, disseram-nos que quantidade não é qualidade. Nós acreditamos que, tal e qual vamos fazer um teste na escola, e quando temos uma avaliação marcada, as pessoas vão estudar para esse teste e para essa avaliação porque têm ali aquela obrigação. Então nós acreditamos que estamos a consciencializar as pessoas a serem mais informadas, porque como vão ter aquela obrigação de votar, vão obviamente procurar ter mais interesse na política porque têm ali aquela obrigação.

Além do mais, o dever de votar é uma obrigação como tantas outras obrigações. Nós temos a obrigação de pagar impostos, porque é que não contestam isso? Nós temos a obrigação de levar os nossos filhos à escola, porque é que não contestam isso? Vão dizer que a educação é uma obrigação que torna isto pior ou melhor? Não prosseguimos por aí.

Disseram também que se nós fossemos às urnas iriam ascender partidos populistas. Então eu pergunto: o que é que está a acontecer hoje, já não estão a ascender esses partidos populistas? Portanto, aí não faz qualquer tipo de sentido.

Para além do mais, é importante dizer que esta é uma medida que é temporalmente situada. Ou seja, nós estamos a lidar perante os resultados da abstenção de hoje. Se calhar, isto em 1975 não faria sentido porque as pessoas iam efetivamente às urnas, e sentiam aquele dever cívico de respeito pelos nossos antepassados que hoje, se calhar, não temos tanto implementado e é isso que queremos implementar.

Como sendo uma medida temporalmente situada, se realmente daqui a alguns anos não fizer sentido implementar o voto obrigatório, e nós como somos um Governo que é pela "mudam-se os tempos, mudam-se as vontades”, e agora, neste tempo, o que é realmente necessário é implementar o voto obrigatório porque as pessoas estão-se a afastar da política, é urgente [ Joana Barata Lopes : Senhora Ministra, dispõe de 30 segundos.] e é extremamente necessário que as pessoas vão votar. Portanto, nós não percebemos exatamente aquilo que querem dizer.

Relativamente às sanções que apresentaram, as sanções não são taxativas, e nós temos um programa de governo e não é um projeto de Lei, no projeto de Lei, sim, iremos elaborar melhor as sanções.

[Aplausos e ovação]

Para terminar quero-vos dizer: a democracia só se consolida quando há uma participação efetiva das pessoas na vida pública.

[Aplausos]

 
Joana Barata Lopes

Tem de terminar, agora, senhora Ministra.

Obrigada.

[Aplausos]

Concluído o exercício, eu passava às votações e perguntava aos grupos neutros, relativamente a quem venceu o debate, quem entende que foi o Governo, do Grupo Rosa, que venceu o debate?

Baixem o braço, por favor.

Quem entende que foi a Oposição 1, Grupo Amarelo, que venceu o debate?

Oposição 2?

Por clara maioria, foi o Governo quem, no entender dos grupos neutros, venceu este debate.

Relativamente à vossa posição sobre o tema, pedia a todos que votassem.

Quem entende que deve ser estabelecido o voto obrigatório, por favor levante o braço.

Quem entende que não deve ser estabelecido o voto obrigatório.

Por clara maioria, a maioria entende que não deve ser estabelecido o voto obrigatório.

Passo a palavra para o magnífico Reitor.

 
Dep.Carlos Coelho

Eu concordo com a vossa votação, acho que o Governo ganhou claramente o debate, mas acho que este debate foi o debate mais equilibrado no que diz respeito à qualidade dos protagonistas, isto é, o Artur esteve muito bem na intervenção inicial, seguro, com bons argumentos, boa colocação de voz.

A Ana esteve muito bem, o truque da apresentação do mapa é fantástico, porque é a visualização de um argumento que vos dá autoridade, portanto corrobora o vosso argumento. A única coisa em que a Ana escorregou foi quando disse à Presidente espere aí só um bocadinho.

[Risos]

De resto esteve muito bem. Os argumentos da Ana e do Rodrigo estiveram muito parecidos. Eu gostei mais da prestação do Rodrigo, porque achei mais elaborada na substância, embora a Ana tenha sido mais eficaz na voz. O Rodrigo esteve muito bem, teve uns momentos fantásticos, um texto muito bom.

E a Marta Pires foi genial nas respostas, vamos ser claros.

[Aplausos]

Alguns dos governos, e bem, anteciparam críticas e tinham textos preparados para responder. A Marta respondeu aqui, in loco , às críticas da oposição e, portanto, foi um debate a sério. Ela reagiu aos argumentos, diz o Duarte, um a um, e fê-lo muito bem.

Marta, quais são as duas únicas coisas a corrigir. Primeiro, a velocidade.

[Risos]

Falar depressa demais não é bom. Transmitir o entusiasmo, convicção, etc., mas às vezes pode perder inteligibilidade. E por vezes o discurso parecia um pouco sincopado. Foram as únicas coisas que, numa demonstração brilhante, me permito chamar a atenção para melhorar ainda.

Mas parabéns a todos, mas parabéns sobretudo ao Governo.

[Aplausos]

 
Duarte Marques

Eu concordo com o Carlos. Acrescentar só, dar a dica à Ana Vidal, sempre que vocês estiverem perto do final do tempo e alguém vos diga "30 segundos”, têm duas formas de fazer isso: ou têm o génio que aquele gajo teve há bocado e dizem "é o prazo de validade”, ou dizem "termino já, senhor Presidente”, "vou já terminar, senhor Presidente”, e fazem a passagem da coisa, é o truque que se usa para ganhar mais uns segundos, "termino já, senhor Presidente”, "vou já encerrar a minha intervenção, senhor Presidente”, há várias deste género, pensem nisto porque ganham mais uns segundos, porque nunca os presidentes são tão rigorosos como o Carlos Coelho, e dá mais 10/15 segundos para falar; usem isto, "termino já senhor Presidente”.

Há bocado houve alguém que fez uma coisa a meio do discurso, que se virou e disse: senhoras e senhores deputados. Isso permite respirar, descansar e voltar ao assunto. Portanto, é um truque, senhor Presidente; dirige-se ao presidente ou dirige-se aos senhores deputados, dá sempre jeito como muleta.

O Artur, eu escrevi aqui, foi limpinho. Ele tem às vezes tanto de padre como de árbitro, é certinho ali, tau, tau, tau… Impecável, nada a dizer, só coisas boas.

O Rodrigo, achei graça, porque ele tem ar de puto, e é um puto que dá uma lição de democracia àqueles mais velhos. E achei imensa graça ao teu desafio e a forma como estiveste.

A Ana lindamente, também. E vocês tiveram o azar de estar num combate muito forte. Eles os dois, estiveram os dois muito bem. Isso é uma grande vantagem, quando um grupo tem o primeiro e o segundo ao mesmo nível… a Marta ia a correr. Ele estava atrás de ti, como se chama aquele de vermelho? Ele há uma altura em que te faz assim nas costas, estava-te a puxar para trás, para te acalmares, porque tu consegues ter uma coisa que é pouco habitual, é falar muito rápido e com uma dicção perfeita. Mas estás-te quase a atrapalhar, vais sempre ali em cima da linha… mas isso é muito arriscado, não há necessidade, e as pessoas começam a achar graça porque estão à espera de quando é que tu te vais atrapalhar. Isso não é para todos, mas reduz lá um bocadinho a velocidade, senão depois a malta não acompanha com a cabeça. Mas parabéns, foi muito bom.

O que tu fazes, e que não resulta, é: tu tens os argumentos todos para responder um a um, e estavas a virar frangos. Vinha um frango, tu viravas; vinha um frango, tu viravas… só que tu não consegues fazer as ligações entre as respostas. Então davas uma resposta, zinga, zinga, zinga… Tens que conseguir ligar isso para dar um discurso mais escorreitinho, porque senão estás assim…

Isto é um defeito que eu consegui encontrar … Obrigado.

[Aplausos]